iFood contratou publicitários para desmobilizar protesto
Muitas empresas tomam iniciativas de contrapartida para desmotivar a causa disfarçadamente. É o caso do iFood.
Campanhas e protestos às mais variadas causas são bastante populares entre os trabalhadores que desejam atenção a clamores antigos e negligenciados. O intrigante é que muitos não sabem que as próprias empresas, órgãos ou demais instituições a quem o protesto se direciona tomam iniciativas de contrapartida para desmotivar a causa disfarçadamente. É o caso do iFood.
Tudo começou em abril de 2021, época em que a campanha de vacinação contra a Covid-19 dava os primeiros passos no Brasil. A princípio, a prioridade foi dada a profissionais da saúde, idosos e pessoas com comorbidades. Contudo, nem todos os brasileiros ficaram de acordo com o plano de imunização traçado pelo Ministério da Saúde.
Foi quando os entregadores de aplicativos de delivery, como o iFood, deram início a um protesto clamando por melhores condições de trabalho e a inclusão destes trabalhadores no grupo prioritário de imunização contra o vírus.
A alegação foi a de que, enquanto o país se mantinha recluso em isolamento social devido às medidas restritivas da pandemia, eles foram alguns dos poucos que possibilitaram a manutenção de uma série de serviços, colocando as próprias vidas em risco.
A empresa decidiu contratar agências de publicidade para se infiltrar em grupos de WhatsApp e Facebook dos motociclistas no intuito de desmobilizar o movimento.
A Agência Pública informou que acessou mais de 30 documentos das campanhas, entre relatórios de entrega, cronogramas de postagens, vídeos, atas de reuniões e trocas de mensagens.
iFood criou páginas falsas na internet sobre o assunto
No dia 21 de abril do ano passado, um manifestante se destacou no ato de protesto. Trajando colete preto e calça verde militar, um homem na casa dos 40 anos transitava em frente ao estádio do Pacaembu na capital paulista. Ele se juntou a um grupo de entregadores de aplicativos como o iFood, que protestavam contra as condições de trabalho.
Na ocasião ele carregava uma faixa de, aproximadamente três metros, além de exibir adesivos que diziam “vacina pros entregadores de aplicativo já”. Estes mesmos adesivos estavam guardados em pacotes carregados por ele enquanto fazia a distribuição na manifestação. Em um primeiro momento o homem parecia tipicamente um entregador envolvido na causa.
Porém, a apuração feita pela Agência Pública mostrou que o homem era, na verdade, um funcionário de uma agência de inteligência e monitoramento digital que prestava serviços para uma campanha contratada pelo próprio iFood.
Sua presença no protesto tinha o intuito de implantar a vacinação como pauta prioritária. O resultado seria a dispersão da narrativa que deu sentido à greve, que seriam melhorias nas condições de trabalho.
Inclusive, há relatos de quem afirma ter atuado em várias campanhas contratadas pelo iFood, as quais são chamadas de Marketing 4.0.
“Você posta memes, piadas e vídeos que promovem uma marca ou ideia, mas sem mostrar quem está por trás. Sem assinar. É aquele tipo de conteúdo que te deixa em dúvida: você não sabe se foi um meme, uma coisa que surgiu na internet ou se teve alguém por trás”, disse a fonte da Agência Pública que não quis se identificar.
A Agência Publica buscou contato com o iFood, que retornou via nota, reproduzida na íntegra:
“A respeito da solicitação da Agência Pública, o iFood informa que não teve acesso aos documentos mencionados e, portanto, não pode opinar sobre o conteúdo destes. A empresa recebe regularmente abordagens e propostas de campanhas de diversas agências de comunicação, porém nunca teve relação comercial com a empresa SocialQi.
A atuação do iFood nas redes sociais se dá estritamente dentro da legalidade, não compactuando com o uso de perfis falsos, geração de informações falsas, automação de publicações por uso de robôs ou compra de seguidores.
O iFood realiza suas comunicações institucionais apenas por seus canais oficiais e contrata agências, como a Benjamim Digital, especializadas em pesquisa de opinião, campanhas de comunicação e monitoramento de redes sociais que acompanham temas em diferentes plataformas.”
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Laura Alvarenga é graduada em Jornalismo pelo Centro Universitário do Triângulo em Uberlândia - MG. Iniciou a carreira na área de assessoria de comunicação, passou alguns anos trabalhando em pequenos jornais impressos locais e agora se empenha na carreira do jornalismo online através do portal FDR e Bit Magazine, onde pesquisa e produz conteúdo sobre economia, direitos sociais e finanças e tecnologia.